Quinta-feira, 26 de Dezembro de 2024

Entrevista: Gabriel Silveira Arruda
PFA de Alagoas completou 45 anos de profissão nesse mês

No último dia 5 de dezembro, o Perito Federal Agrário e também Delegado Sindical do SindPFA em Alagoas, Gabriel Silveira Arruda, completou 45 anos de sua colação de grau em Engenharia Agronômica, pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE).

Natural de Maceió, Gabriel tem 66 anos e é mestre na área de solos. Aos fins de semana, ministra aulas no curso de Zootecnia da Universidade Estadual de Alagoas (Uneal).

Por ocasião da data, o SindPFA entrevistou o profissional, que atendeu prontamente. Veja abaixo na íntegra.


SindPFA: O que o levou a escolher Engenharia Agronômica como formação?

Gabriel – Apesar de ser nascido e criado na capital, adorava quando entrava em contato com a natureza. Gostava, por exemplo de passar as férias na fazenda de um tio. Papai me incentivou muito. Ele criou-se no campo.

(Na foto ao lado, Gabriel recebe o beijo do pai na cerimônia de colação de grau).

SindPFA: Você comentou há um tempo que ainda tem contato com seus colegas de classe. Com que frequência se reúnem? 

Gabriel – Sim. Até a comemoração dos 40 anos tínhamos encontros de 5 em 5 anos. No tal ano um dos organizadores faleceu poucos meses antes. Daí resolvemos nos encontrar todos os anos. Dá mais oportunidade de participação aos que forem morrendo (espero estar no fim da fila…risos). Minha turma é irreverente.

SindPFA: Houve algum evento especial por ocasião dos 45 anos de formatura?

Gabriel – Sim. A cada ano inventamos algo para incluir no roteiro. Mas as histórias são as mesmas… As famílias não aguentam mais ouvi-las. Faz parte do ritual homenagear quem completa 69 anos, pois durante o ano seguinte (se vivo estiver) completarão 70 anos. Ademais a turma é de 69 (1969).

SindPFA: Algum outro colega está no Incra? Que caminhos seguiram?

Gabriel – Soube esse ano que o Severino Ivandro era do INCRA. Nunca frequentou nossos encontros e pode já estar aposentado. Alguns se tornaram Agrônomos Canavieiros. Esses são produtores rurais hoje. Outros fizeram carreira universitária (em torno de 10 a 12). Boa parte trabalhava para empresas de fertilizantes e outros insumos. Enfim, uma considerável parte de nós tornou-se Extensionista Rural.

SindPFA: Consta que você ingressou no Incra em 2004, portanto há 10 anos. Então foram 35 anos de atuação antes de ingressar na autarquia. Onde e como atuou nesse período?

Gabriel – Trabalhei na Extensão Rural por quase 28 anos. Rápida passada pela iniciativa privada, logo que me formei. Faz 16 anos que sou professor. Inicialmente Professor Substituto. Daí assumi por concurso uma área do Curso de Zootecnia da Uneal (Universidade Estadual de Alagoas). (Ministro aulas) nos fins de semana. Adoro ensinar. O contato com os jovens me revigora.

SindPFA: Você hoje está lotado na Divisão de Obtenção de Terras. Já passou por outras áreas?

Gabriel – Com dois anos de trabalho, fui convidado pelo então Superintendente, a chefiar a Divisão de Ordenamento da Estrutura Fundiária. Passei seis anos lá. Fui exonerado em maio de 2012.

SindPFA: Se pudesse eleger um caso que considere inesquecível nesses 45 anos de profissão, qual seria? 

Gabriel – É um caso jocoso vivido na extensão. Logo no começo. Estava na agência do Banco do Brasil fazendo uma reunião com os produtores que iriam tirar empréstimo naquele dia. Depois de uma bem sucedida palestra sobre as vantagens de se aproveitar a matéria orgânica, no final o produtor me elogiou assim: “Doutor, gostei muito de sua palestra, mas quem vai pela cabeça dos outros é piolho”. Foi uma gozação geral com o garoto de 23 anos. Ri muito também. Tive outros “causos” também, mas esse para mim foi inesquecível.

SindPFA: E no Incra?

Gabriel – No Incra teve uma situação de estresse, que é uma história muito longa. Foi um “treinamento em serviço”. Mas o que teve o lado bom. Levamos um puxão de orelha da dupla Marcelo Afonso e Sebastião Parreira. Bateram forte. Éramos em sete, novos e inexperientes no Incra. Eles desceram de Brasília para nos colocar nos eixos. Depois desse evento, nossa postura mudou. Valeu. Se é algo que critico muito em nossa autarquia é a falta de qualificação. É tudo no improviso. Para assumir um escritório na Extensão Rural, passei por um treinamento de 3 meses  – chamado de “pré-serviço”. No Incra nos deram um manual (vigente à época) e se virem… Então qualifiquei o recado da dupla, como sendo treinamento. E hoje agradeço.

SindPFA: Como avalia o trabalho desenvolvido como Delegado Sindical da categoria na sua regional? Como foi e está sendo o relacionamento com os colegas?

Gabriel – Tentei fazer um trabalho consciente. Quem tem de me avaliar são eles. Mas todos somos humanos e temos nossas imperfeições. Tivemos um momento muito bom, na luta salarial, em 2013. Quando a categoria resolveu aceitar a proposta do governo, eles não gostaram. Hoje sinto um certa apatia por parte do grupo.

Particularmente, acho que eles não vislumbram mais futuro no órgão. Discordo da apatia do grupo, mas respeito muito eles. Cada cabeça é uma sentença. Quem tem de cuidar dos nossos interesses somos nós mesmos. Ou nos unimos ou perdemos o respeito.

Têm de ver como o Sindicato cresceu e ocupou espaço pela luta. Não é fácil enfrentar esse rolo compressor. A sociedade não nos percebe como categoria. Não podemos arrefecer. O sindicato não é perfeito. Nós não somos perfeitos. Cito Kennedy: não pergunte ao seu país o ele que pode fazer pode fazer por você. Pergunte o que pode fazer, você, pelo seu país. No nosso caso: o que cada um espera do sindicato? Mas o que cada membro pode fazer para melhorar o Sindicato? Se o SindPFA é imperfeito, nós é que somos perfeitos? Não falo para meus colegas de Alagoas. Falo para os colegas do Incra.

SindPFA: Independente do trabalho sindical, como é o relacionamento dos Engenheiros Agrônomos em Alagoas? 

Gabriel – Temos a SEAGRA (Sociedade dos Engenheiros Agrônomos de Alagoas) como órgão classista aqui. Meia dúzia de abnegados, mas a categoria é dispersa. Essa falta de sentimento de corpo me traz uma certa frustração. Tenho muito orgulho de minha profissão e convicção do papel dela na sociedade. Precisamos nos dar conta dessa importância.

SindPFA: Além do SindPFA, você já atuou em alguma outra entidade ou conselho de classe?

Gabriel – Sim. Fui conselheiro do CREA-AL e coordenador da Câmara de Agronomia.

SindPFA: Com esses 10 anos de Incra, qual percepção você tem do órgão hoje? E da atuação do Engenheiro Agrônomo dentro da Autarquia ou na política agrária?

Gabriel – Me “converti” à reforma agrária assim que entrei no Incra. Mas acho que o órgão falhou muito no processo do desenvolvimento dos assentamentos. Como disse, tudo é no improviso para atender os anseios dos movimentos sociais. Se as decisões fossem mais técnicas e as coisas fossem feitas com planejamento, teríamos tido mais sucesso. A autarquia está sucateada. Pelo menos aqui em Alagoas.

Há de se relatar também que o Incra também tem como missão o gerenciamento da malha fundiária do país. Nesse ponto, a autarquia é ineficaz. É correta a preocupação do SindPFA com a Governança Fundiária. Pena que a atual direção parece não nos ouvir. Segundo consta, no INCRA tem Engenheiros Agrônomos que dominam bem a matéria.

SindPFA: Qual percepção você tem para o futuro da Engenharia Agronômica?

Gabriel – A Engenharia Agronômica é uma profissão mãe, a exemplo da Engenharia Militar e Civil. No nosso caso, a Ciência Agronômica é muito eclética. Em nossa formação acadêmica temos desde as Ciências Exatas, passando pela Biologia e indo ao oposto que são as Ciências Sociais.Ninguém dá conta de ser bom em tudo.

A sociedade quer soluções. Não quer saber qual o profissional. Ou nós oferecemos soluções concretas, ou sucumbimos como profissão. Hoje temos os Zootecnistas, os Engenheiros de Pesca, os Engenheiros Agrícolas, Biólogos etc. A solução é se especializar. Nem na extensão cabe mais o Engenheiro Agrônomo generalista. Veja o nosso caso. Os colegas que trabalham com  vistoria e avaliação ganharam respeito. Somos, indubitavelmente, o grupo mais preparado em Engenharia de Avaliação de imóveis rurais do país. Isso nós conquistamos. Apesar das deficiências Institucionais. Mas isso é esforço nosso. O órgão pouco ou quase nada nos qualificou.

Temos de oferecer serviços de qualidade. Acho que os novos Engenheiros Agrônomos deveriam empreender mais. Nem só de emprego precisamos viver. Se você é bom em algo, é percebido pela comunidade. Tenho um ex-aluno, hoje Zootecnista, que começou com um trator. Hoje tem uma pequena patrulha mecanizada. Cobra R$ 200,00 para regular uma plantadora. Ele oferece soluções para quem o procura.

SindPFA: Valeu – e vale – a pena ser Engenheiro Agrônomo?

Gabriel – Adoro minha profissão. Para mim valeu. Gostaria de ter atingido a expertise em uma área. Mas as condições não o permitiram. Se hoje vale a pena ser Engenheiro Agrônomo, é uma questão individual. Para esse Zootecnista que falei está valendo a pena, pois ele puxou a responsabilidade de seu sucesso para sí. Não ficou resmungando, nem culpando o governo. Agiu. Parece inadequado um sindicalista estar falando isso. Mas é como vejo esse contexto. Continuo aprendendo. Com meus alunos, com meus colegas, com minhas filhas, e até com o sorriso de meus netos. Me ensinaram que tudo valeu a pena.


Por KASSIO ALEXANDRE BORBA

Coordenador Executivo