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A explosão nas ruas do Brasil pegou muita gente desprevenida, incrédula. Muitos, nós podemos até entender. Mas a elite política, jornalistas, analistas e criadores de opinião, surpresos, vacilantes e sem explicações plausíveis? É de doer!
Como sempre, sentados sobre sua peculiar arrogância envernizavam alguns progressos da economia brasileira. Não prestaram atenção nos sinais vindos do passado recente. O rápido surgimento das manifestações, o volume, a extensão, e o poder de multiplicação não são frutos da magia da internet. Não são tão espontâneos assim. Apenas afloraram. Expressam um longo trabalho subterrâneo de observação cotidiana, de uma crítica silenciosa e, ao final, contanto com o poderoso suporte da rede, alcançou o amadurecimento na forma de uma manifestação grandiosa e insistente sobre o processo político do país. Foi a gota d”água suficiente. “… Pipoca ali, aqui, pipoca além. Desanoitece a manhã. Tudo mudou…”. Nada mais atual do que esses versos de Caetano Veloso em Pipoca Moderna. As cenas de vandalismo não turvam a incrível aula de Educação Moral e Cívica ( ! ) nas ruas.
Os sinais já estavam aparecendo e eram observados desde o ano passado na greve dos servidores públicos federais. Os servidores, parcela importante e representativa da população, anteviam o sentimento de inconformidade e descontentamento. Naquele momento o governo esperava que a CUT, suas confederações e sindicados pudessem conter o princípio de revolta que surgia. Ficaram irritados porque não conseguiram. E, pior, não perceberam o que estava por vir, que aquele movimento havia sinalizado uma saída para a população: as mobilizações de massa. Aquele movimento era um embrião que cresceria. Naquela hora o barco já estava fazendo água. As autoridades podiam e deviam ter entendido que aquele sinal era a ponta do iceberg aparecendo por conta da decepção causada pelos governos lula-dilma. Por conta desses anos todos sem solução para as questões básicas do país. Era a miopia política e a arrogância dando a ar de sua desgraça.
O Congresso, os políticos de modo geral, essa pequena casta voltada para si, tão cega, deliciando-se com as benesses que o poder lhes proporciona, não perceberam o rio que corria sob seus pés. Muitos ainda permanecem mudos e irredutíveis. Recusam-se a aceitar a realidade, mesmo com o povo revoltado batendo na porta do seu castelo para questionar a sua representação. Hoje, já é aceitável a compreensão de que para boa parte deles não haverá regeneração moral e política.
Algumas conclusões visíveis são resultantes deste silencioso e persistente processo invisível e solitário. O sistema político brasileiro burocratizou-se, encastelou-se e cerceou a participação popular. Preocupado com seu umbigo, tem sido incapaz de conectar-se com a mobilidade e com os anseios da população. Os atuais represententes do poder constituído, as instituições, estão sendo questionados. Para boa parcela da população elas não mais os representam. A crise é institucional.
Durante muitos anos o PT e a CUT cumpriram um papel militante. Eram os grandes interlocutores nacionais. Foram construídos pela sociedade civil organizada e eram os fiéis depositários de esperanças na luta contra o atraso e a corrupção, pela modernidade e inserção do país no mercado mundial. E, possuíam, de fato, um espaço de representação, manifestação e de construção da política. Contudo, esse espaço não existe mais. Do ponto de vista organizativo as manifestações revelam essa ausência. Não há um lugar militante, um canal de participação direta da sociedade.
O partido do governo, surgido na redemocratização do Brasil, fez grandes mudanças no país. Mas, pode-se dizer que o realizado ficou abaixo do necessário e muito aquém do suficiente. Perdeu-se a oportunidade histórica. E pior, reavivou certas mazelas encruadas na história nacional. A mais nociva corrupção desenfreada foi exponenciada. Culminou no gasto excessivo e absurdo com a copa do mundo que, pela sua dimensão, pode ser considerado como um fator determinante dos protestos. Segundo matéria publicada na UOL (www.uol.com.br) em 29/06/2011, a copa do mundo no Brasil está orçada em cerca U$40 bilhões, gasto maior que a soma das três últimas copas somadas (2002 na Korea/Japão: U$16 bilhões; 2006 na Alemanha: U$6 bilhões; e 2010 na África do Sul: U$8 bilhões). E os lucros da FIFA?
Não é à toa que os cartazes nas passeatas exigem saúde, transporte e educação, serviços públicos com “padrão Fifa”. As áreas mais carentes de investimentos públicos foram preteridas pelo futebol. Um povo roubado descaradamente, desprezado, oprimido e sem espaço, se insurge! Rejeita o nariz de palhaço, deixa o controle remoto, usa de toda a sua criatividade e vai à luta. Vinte centavos pode ter sido o preço da virada. Ajudou a derrotar a máfia do transporte que financia as campanhas eleitorais ( por isso o custo elevado!!!). Mas a lista dessa conta é longa. São longos anos de descaso, de sofrimentos e desmandos. O povo brasileiro não é bobo e descobriu a sua força na mobilização. O indivíduo não está só.
De todo modo, saudamos o povo brasileiro. Saudamos a sua coragem e a sua capacidade de não engolir o abuso e de chutar o balde, apesar e contra os poderes constituídos. Esperamos que este movimento não caia nas armadilhas dos espertos de plantão, nas garras da direita. Esperamos que o movimento conquiste as suas principais reivindicações e ajude a sepultar a burocracia, a corrupção e os velhos políticos parasitas. Esperamos que a virada de mesa resulte em novas formas de organizações, independentes e populares, sem vínculos partidários, na prática permanente da reivindicação. O espontaneímo das massas precisa se consolidar em forma organizada na base da sociedade. A única salvaguarda do povo é a sua organização. O desejo de participar das decisões estratégicas do país deve encontrar um espaço orgânico para se estabelecer. O movimento contra Collor desapareceu. Collor é parlamentar. Vinte anos depois surge um novo movimento revigorado. Não podemos esperar tanto tempo! Todos os anseios da população precisam ter consequências práticas. Assim, deste canteiro, é certo que apareçam novas lideranças políticas comprometidas com a vontade da população em busca de um futuro melhor.