Terça-feira, 10 de Dezembro de 2024

Incra mais uma vez no noticiário nacional
Ano de 2016 mal começa e autarquia volta a ser destaque negativo no noticiário nacional

Na primeira reportagem especial do ano, intitulada “Golpe na Reforma Agrária”, o programa Fantástico, da Rede Globo, deste domingo (03/01) exibiu dois dos mais sérios problemas que a autarquia vivencia há décadas e nunca soube tratá-los como deveria: o comércio ilegal de terras federais e as ocupações irregulares em assentamentos rurais.

Segundo relatório de auditoria da Controladoria Geral da União – CGU, empresários, autoridades públicas, menores de idade e até mortos constam da lista de beneficiários do Programa Nacional de Reforma Agrária. A reportagem completa por ser vista no link a seguir: http://globoplay.globo.com/v/4714044/.

Para o Secretário Federal de Controle Interno da CGU, Francisco Eduardo de Holanda Bessa, dos 76 mil lotes irregulares, cerca de 50% constam do cadastro do Incra como sendo ocupados por servidores públicos das diferentes esferas de governo.

Na maioria das vezes, as auditorias da CGU são realizadas por meio de amostragem e revelam somente a ponta do que pode ser um enorme iceberg, pois há casos em que lotes ocupados irregularmente em assentamentos da reforma agrária em todo o país estão em nome de “laranjas”, e por trás de tudo isso, os “verdadeiros donos da terra” nunca aparecem, mas exploram tanto os recursos que ela dispõe, como as pessoas que nela labutam.

Destaca-se que há inúmeros casos em que o beneficiário da reforma agrária consegue se estruturar no projeto de assentamento, acessar políticas tal como a de Educação na Reforma Agrária (Pronera) e, posteriormente, ingressar no serviço público ou em algum cargo eletivo legitimamente. Não é porque o agricultor virou professor na rede pública ou vereador, por exemplo, que ele deixará de ter direito à terra que conseguiu quando não tinha esta condição. Aliás, este é um dos objetivos do programa, ou seja, que os agricultores e suas famílias melhorem de vida cada vez mais.

Todavia, as explicações dadas pela Chefia de Gabinete e não pelos reais responsáveis pela autarquia demonstram a situação de sucateamento em que se encontra o órgão federal, vez que em pleno século XXI o Incra não dispõe de uma ferramenta tecnológica capaz de servir de base para os trabalhos de cadastro e fiscalização das terras sob sua responsabilidade, bem como dos beneficiários.

As ações de retomada de lotes dadas como medida para sanar as irregularidades são extremamente custosas, pois implicam em fazer fiscalização in loco, e é praticamente certo que a autarquia não consiga solucionar este problema de um ano para o outro, pois novos casos tendem a surgir pelo país e assuntos desta natureza nunca saem da rotina do órgão.

 

Muito discurso e pouca ação 

A partir de amanhã o Ministro do Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, completará um ano no cargo no Governo Dilma Rousseff, e só o que se viu foram discursos, mas nada de concreto.

Ao tomar posse no dia 06 de janeiro de 2015, Patrus anunciou que tiraria debaixo da lona 120 mil famílias até o final do Governo em 2018, mas até agora os seus resultados estão entre os menos significativos dentre todos os ministros que ocuparam a pasta na gestão petista, com apenas 26.338 famílias assentadas no ano. Considerando-se o número de famílias assentadas em áreas novas por decreto de desapropriação, este número é igual a zero.

No último ano o MDA perdeu mais de 60% do seu orçamento e o Incra, sua única autarquia, está agonizando a cada dia. Sem recursos, sem estrutura e com servidores completamente desmotivados e sem perspectivas de futuro.

Iniciado mais um ano eleitoral, é muitíssimo provável que os anúncios e as promessas continuem por parte de Patrus Ananias, como já tem feito, pois este tende a candidatar-se ao cargo de Prefeito da cidade de Belo Horizonte em Minas Gerais, seu estado de origem.

Enquanto isso, pessoas como o Senhor José Gomes da Silva e sua esposa Geni, que lutam há quase 10 anos por um pedaço de terra na região de Andradina-SP, tal como mostrou a reportagem, continuam na espera por uma oportunidade.

 

Leitura do SindPFA

Muito além de questões orçamentárias e de infraestrutura tecnológica, a origem de todo o problema vivido na reforma agrária e na gestão de terras do país é, sobretudo, política. Uma das principais causas dos problemas apontados na reportagem, por exemplo, é a ausência de uma gestão eficiente e comprometida com o bem público.

É imprescindível, pois, que muitas outras ações do ponto de vista político e de gestão sejam tomadas, que o “Núcleo Duro do Governo” esteja comprometido com a Política Agrária e faça as transformações para que o Incra cumpra com sua missão institucional, que é a gestão das terras do país. Pela Constituição Federal a propriedade deve cumprir com a sua função social e o Estado deve zelar por isso.

É necessário que se regulamente o Decreto 3.135, de 10 de agosto de 1999, que trata da escolha do cargo de Superintendente Regional do Incra. Gestores indicados politicamente nas Superintendências Regionais são os principais responsáveis por situações como as vividas no Acre, relatados na reportagem, onde um Procurador da Justiça possui vários lotes cadastrados em seu nome, da esposa e de parentes. O processo seletivo para os DAS-1 e DAS-2 anunciado no final do último ano pela gestão do Incra está longe de ter o alcance da regulamentação do decreto, que poderia até atingir DAS-05 e DAS-06.

É preciso também que os movimentos sociais do campo cumpram com o seu verdadeiro papel, lutando para que pessoas como o senhor José Gomes da Silva e Dona Geni mostrados na reportagem, assim como muitos outros na mesma situação em todo o Brasil, tenham uma vida digna no espaço rural.

É importante que toda a sociedade esteja ciente do verdadeiro papel e da importância do Incra como órgão promotor do desenvolvimento, da justiça social e da soberania nacional.

Por fim, é fundamental que os servidores do órgão comprometidos com a boa prestação do serviço público tenham sua autoestima resgatada, sejam valorizados e recebam uma remuneração digna, e aqueles que se desvirtuam do caminho correto sejam efetivamente responsabilizados.

Por SAVIO SILVEIRA FEITOSA

SEDE / DF